Mundiais: 39 convocados e 53 vagas não preenchidas – Questões ao que a Federação não comunica!
Na antecâmara dos Campeonatos do Mundo, é importante analisar as convocatórias da seleção de Portugal nas várias disciplinas, e compreender onde poderiam (ou não) serem inscritos mais atletas. A formação lusa conta com 39 convocados, mas muitos outros o poderiam ter sido, registando-se pelo menos 53 vagas que não estão ocupadas por este ou aquele motivo. Mais do que apontar o dedo ao que quer que seja, queremos lançar perguntas ao trabalho e às decisões da Federção Portuguesa de Ciclismo, que, uma vez mais, teimam em não ser respondidas no momento do anúncio dos selecionados.
Estrada – Elites Masculinos
Nos Elites Masculinos na vertente de estada, Portugal ocupava o 14º posto à data de fecho do ranking para a qualificação. De acordo com a tabela regulamentar, isto equivalia à possibilidade de inscrever seis atletas, mas, de acordo com a convocatória da FPC, foram apenas quatro os selecionados: André Carvalho (Cofidis), João Almeida (UAE Team Emirates), Nelson Oliveira e Rúben Guerreiro (Movistar Team), deixando assim dois lugares em aberto.
A maior ausência é a de Rui Costa (Intermarche – Circus – Wanty), ele que já em 2022 tinha descoberto pela Comunicação Social que não estava convocado. Além do Campeão do Mundo de 2013, não integram também a convocatória os gémeos Oliveira e Iúri Leitão, sendo que os três irão focar-se na pista. Caberia assim a responsabilidade à seleção de um atleta de uma formação continental, numa chamada que seria um desafio, já que a corrida de fundo decorrerá no dia 6 de agosto, apenas três dias antes do início da Volta a Portugal.
Selecionar algum elemento de uma equipa Portuguesa não seria certamente fácil, já que por norma os blocos lusos têm na Volta a Portugal a maior corrida do seu calendário. Porém, cada formação pode levar apenas sete ciclistas para a Volta, e aqui o problema começa a solucionar-se. As formações da ABTF Betão – Feirense, AP Hotels & Resorts / Tavira / SC Farense, Credibom / LA Alumínios / Marcos Car, Efapel Cycling, Kelly – Simoldes – UDO, Radio Popular – Paredes – Boavista e Tavfer – Ovos Matinados – Mortágua contabilizam pelo menos 8 portugueses no seu plantel, pelo que, no mínimo, um deles terá sempre de ficar de fora da chamada para a Grandíssima.
Sim, não estamos a falar na seleção de um corredor que possa discutir o Campeonato do Mundo, mas alinhar com seis elementos ao invés de quatro é e sempre será uma vantagem competitiva, já que permitirá à formação portuguesa proteger as suas principais armas para os momentos decisivos da corrida. Mesmo que sejam elementos que não terminem a corrida, todos os detalhes contam, e a importância de levar a melhor formação possível é crucial se Portugal quer lutar de frente com as outras nações pelo Campeonato do Mundo.
A ausência de dois elementos na convocatória para a prova de fundo está ainda por explicar, e o mínimo de respeito pela FPC para com os seus sócios e os adeptos de ciclismo seria anunciar a não ocupação das duas vagas explicar o porquê da decisão, mas, até ao dia de hoje, tal ainda não foi feito.
Para o contrarrelógio, Nelson Oliveira e João Almeida ocupam as duas vagas disponíveis.
Estrada – Elites e Sub-23 Femininas
Nas Elites Femininas contamos com um cenário idêntico, mas há um problema maior que parte da UCI. As ciclistas Elite e Sub-23 terão Títulos Mundiais distintos, mas disputados em simultâneo, numa mesma corrida. As atletas já reagiram à situação com desagrado há meses, mas nenhuma medida foi assimilada pela UCI para 2023, que irá assim entregar uma camisola arco-íris a uma atleta que não será a primeira a cortar a linha de chegada.
Portugal contabilizava três vagas neste Campeonato do Mundo, mas apenas Vera Vilaça (Massi – Tactic) e Daniela Campos (Bizkaia – Durango) foram selecionadas. As duas farão apenas a prova de fundo, sendo que nenhuma representará Portugal no contrarrelógio, ao qual tínhamos, também, duas vagas alocadas! De fora ficam nomes com Maria Martins (Fenix – Deceuninck), Beatriz Pereira (Bizkaia – Durango), Beatriz Roxo (Cantabria Deporte – Rio Miera), Mariana Líbano e Sofia Gomes (Soltec Team), mas também as Campeãs Nacionais de Fundo, Cristiana Valente (Glassdrive – Chanceplus – Allegro) e de Contrarrelógio, Ana Caramelo (Maiatos).
As explicações que podem ser dadas são muitas. O ciclismo feminino em Portugal está numa fase ainda bastante precoce comparado aos principais países que por norma disputam as medalhas, mas um Campeonato do Mundo é um Campeonato do Mundo, e não há muito aconteceu de uma fuga vingar nos Jogos Olímpicos. Mais do que estar na disputa de medalhas, há uma importância gritante em dar experiência a todas as nossas atletas, fazê-las ganhar contactos que as podem puxar para equipas continentais e que as possam ajudar a evoluir. De outra forma, o ciclismo feminino em Portugal terá uma curva de evolução muito pouco acentuada.
Se isto não for suficiente, podemos referir que a participação numa corrida deste nível é um dos requisitos para que as atletas possam ser consideradas “de alto rendimento” enquanto estudantes universitárias, e, uma vez mais, isso seria um fator fundamental ao seu desenvolvimento profissional que lhes está a ser negado.
Estrada – Sub-23 Masculinos
Esta é talvez a categoria onde Portugal coloca mais esperanças, e por isso, felizmente, todas as vagas foram alocadas. Convocados estão António Morgado e Gonçalo Tavares (Hagens Berman Axeon), Daniel Lima (Israel – Premier Tech Academy), Diogo Gonçalves (Santa Maria da Feira / Segmento d’Época / Reol) e Lucas Lopes (Electro Hiper Europa). As duas vagas do contrarrelógio serão ocupadas pelos dois ciclistas da equipa americana.
Estrada – Juniores Masculinos
Nos Juniores Masculinos, Portugal contabilizou apenas duas vagas, já que era uma das nações que não apresentava entrada no ranking UCI. A isto deve-se a ausência de participação Portuguesa em corridas pontuáveis para o ranking, registando-se apenas o Trophee Centre Morbihan, corrida da Taça das Nações onde Portugal não colocou nenhum atleta no top35. Com mais participações, certamente poderíamos ter obtido um lugar nos 25 primeiros do ranking UCI, onde veríamos pelo menos mais uma vaga atribuída, mas nem sempre é fácil conciliar os estudos com o calendário competitivo, e o período escolar em Portugal não facilita a participação em corridas pelo estrangeiro. Em todo o caso, mais corridas foram feitas noutros anos, e por isso não há grandes desculpas que se possam dar para a ausência dessas participações em 2023.
Convocados estão José Moreira (Silva & Vinha / ADRAP / Sentir Penafiel) e Tiago Santos (Alcobaça CC / Crédito Agrícola), que farão a prova de fundo, mas não o contrarrelógio, onde Portugal poderia novamente colocar dois atletas.
Estrada – Juniores Femininas
Nas Juniores Femininas, Portugal poderia levar quatro ciclistas para participar no Mundial, mas, ao invés do que aconteceu na Bizkaikoloreak Juniors, corrida da Taça das Nações disputada no último fim de semana, levará apenas duas: Daniela Simão (Academia Efapel de Ciclismo) e Raquel Dias (Extremosul / Hotel Alísios / CA Terras do Arade), que farão apenas a prova de fundo. As duas vagas que teriam direito a utilizar para a participação no contrarrelógio individal ficam também em aberto.
Mais do que nos repetirmos a justificar o porquê de não terem sido convocadas mais atletas, levantamos apenas uma questão. Não teria sido mais proveitoso poupar a ida ao País Vasco e levar as quatro atletas que participaram na Taça das Nações ao Campeonato do Mundo?
Pista
Nas disciplinas de Pista, Portugal estará representado com os seus principais atletas, que já há algum tempo vêm trabalhando, e muito bem, esta vertente. Todas as vagas foram alocadas, mas destacam-se as ausências de qualificação no Scratch e na Corrida por Pontos (na qual temos a posição de reserva 5) do lado masculino, e da Eliminação do lado feminino. Em todo o caso, as qualificações para o Omnium e para o Madison (masculino) estão asseguradas num importante passo para a qualificação Olímpica para Paris 2024!
Iúri Leitão será o representante português no Omnium e os gémeos Rui e Ivo Oliveira (UAE Team Emirates) serão chamados para correr no Madison. Ivo Oliveira fará também a Perseguição Individual e e Rui Oliveira a corrida de Eliminação. João Martins (Rádio Popular – Paredes – Boavista) foi convocado como substituto em caso de alguma eventualidade.
Do lado feminino, Maria Martins (Fenix – Deceuninck) competirá no Omnium e no Scratch, enquanto Daniela Campos (Bizkaia – Durango) fará a Corrida por Pontos.
MTB – XCO Elites
No caso do Mountain Bike, os Elites começam por ser o caso mais flagrante e logo na vertente de XCO, com apenas uma vaga ocupada em seis possíveis, três do lado masculino e três do lado feminino. Raquel Queirós (MMR Factory Team) será a única representante portuguesa, ficando de fora nomes como o Campeão Nacional de XCO Roberto Ferreira (Guilhabreu MTB), Mário Costa ou Ricardo Marinheiro (BTT Matosinhos), e também Joana Monteiro ou Ana Tomás (SAERTEX Portugal / Edaetech) do lado feminino. Todos os inscritos no XCO poderiam também fazer o XCC, pelo que Raquel Queirós será a única representante portuguesa em mais uma disciplina.
MTB – XCO Sub-23
Nos Sub-23 alinharão Ana Santos (X-Sauce Factory Team), Diogo Neves (Guilhabreu MTB) e João Cruz (Axpo / FirstBike Team / Vila do Conde), ocupando apenas três das onze (!!) vagas disponíveis! Do lado masculino, quatro atletas poderiam alinhar, e de fora ficam nomes que já no último Campeonato da Europa estiveram presentes, como foram os casos de Artur Mendonça, Tomás Frazão ou Alexandre Gonçalves.
Do lado feminino seria talvez mais difícil encontrar as sete atletas cujo ranking garantia a Portugal, mas, uma vez mais, algumas delas poderiam ser preenchidas, com a convocatória de, por exemplo, a Campeã Nacional Sub-23, Laura Simão (BTT Loulé / Elevis), Beatriz Sousa e Íris Chagas (Guilhabreu MTB), entre outras.
MTB – XCO Júnior
No escalão de Juniores, Portugal vai alinhar com Beatriz Guerra, Guilherme Barros e Rafael Sousa (Guilhabreu MTB), ocupando três das doze (!!) vagas disponíveis! Do lado masculino, apenas Guilherme e Rafael vão preencher a convocatória que poderia integrar cinco atletas, e da qual se encontram ausentes, por exemplo, Tomás Gaspar (Penafiel Bike Clube), Rodrigo Araújo, Eduardo Rodrigues ou João Fonseca (Clube BTT Matosinhos).
Do lado feminino, apenas Beatriz Guerra irá alinhar, numa corrida em que sete vagas poderiam também ter sido alocadas, apesar de, tal como nas Sub-23, ser bastante difícil garantir que todas elas pudessem ser preenchidas. Em todo o caso, nenhuma explicação adicional foi dada quanto ao número de vagas atribuídas e ao preenchimento de apenas uma.
MTB – XCM
No caso do XCM, esta será das disciplinas mais específicas para fazer uma seleção. A qualificação integra o ranking da Taça do Mundo e UCI, mas oferece também a possibilidade de cada federação inscrever 10 ateltas extra. Guilherme Mota (Guilhabreu MTB), José Dias (Buff – Megamo Team) e Tiago Ferreira (DMT Racing Team) para a prova masculina, mas não integrará a corrida feminina onde Melissa Maia (Korpo Activo – Penacova) poderia ser uma das grandes candidata às primeiras posições!
MTB – Downhill Elites
Na vertente de Downhill, Nuno Reis (Casa do Povo de Abrunheira) e Gonçalo Bandeira são os representantes no escalão Elite, no qual tínhamos a possibilidade de inscrever 13 (!!) atletas! Do lado masculino, seis atletas poderiam integrar a comitiva, mas destacam-se as ausências de José Borges, Vasco Bica e Vasco Vasconcelos, todos eles ciclistas que terminaram o Campeonato Nacional a menos de 4s do vencedor, Gonçalo Bandeira, inclusive os dois primeiros no pódio. A falta de atletas não pode ser questionada, já que 53 inscritos foi o número totalizado no Campeonato Nacional.
Do lado feminino, a história já não é bem a mesma. Apesar das sete vagas possíveis de alocar, não seria fácil encontrar atletas para as completar a todas, já que apenas seis integraram o memso Campeonato Nacional. Margarida Bandeira (Wildboys | Riding Addiction) poderia ser a escolha mais capaz de um bom resultado, mas também ela ficou de fora.
MTB – Downhill Juniores
Nos Juniores irão alinhar por Portugal Álvaro Pestana (Casa do Povo de Abrunheira) e Pedro Câmara (Atlético Desportivo S. Pedro), ocupando duas das doze vagas disponíveis. No lado masculino ficam por ocupar três vagas, quando mais de vinte atletas participaram no Campeonato Nacional, enquanto do lado feminino a história é distinta, já que não se atribuiu um Título Nacional devido à falta de atletas em prova.
BMX
Na disciplina de BMX, o júnior Renato da Silva foi o único convocado, ocupando uma das sete vagas disponíveis. Portugal poderia integrar um atleta em Elites e Sub-23, Masculinos e Femininos, enquanto nos Juniores poderia levar dois ciclistas do lado masculino e uma do lado feminino. Apesar de ser uma disciplina à qual não fazemos acompanhamento, poderia muito bem ser também possível a integração de atletas em todos os escalões, dados os resultados dos Campeonatos Nacionais e das Taças de Portugal.
Paraciclismo
Nas disciplinas de Paraciclismo alinhará Telmo Pinão (Academia Efapel de Ciclismo), na classe C2 na vertente de pista, juntando-se na estrada, na mesma categoria, a Bernardo Vieira (C1), Flávio Pacheco (H4) e Luís Costa (H5). Todos participam no contrarrelógio e na prova de fundo.
A análise a esta convocatória vem expôr alguns números que, habitualmente, a FPC teima em não partilhar, por algum motivo que desconhecemos. Não queremos entrar pela questão financeira, números esses que desconhecemos, até porque sabemos que o investimento em Portugal é reduzido, e para levar o dobro dos atletas que integram a comitiva seria preciso um esforço bastante maior nesse sentido.
Fica a questão sobre os motivos para as ausências, disciplina a disciplina, que poderiam e deveriam ser comunicados. Para as mesmas é importante ter respostas, e já nem dizemos apenas pelos sócios e adeptos da modalidade, mas também pelos próprios ciclistas, que certamente poderiam e gostariam de estar presentes, mas que vêem negada a sua participação. Só com a devida transparência poderá ser compreendido o processo de trabalho, e, uma vez mais, de forma repetida, é este o caso sucedido na FPC no que diz respeito à participação em competições internacionais.
Foto: UVP/FPC